Para começar, o governo que Portugal tem neste momento, liderado por José Sócrates, não foi eleito. Muita gente pensa que assim o é, mas nunca nenhum governo foi eleito em Portugal na Terceira República em que vivemos. No nosso sistema eleitoral o povo tem o direito ao voto apenas para o poder legislativo e não para o poder executivo. Se é algo de bom ou algo de mau é discutível, mas o que é certo é que muitas autarquias (cujo poder executivo é eleito directamente pelo povo) funcionam muito melhor do que qualquer governo que tenha existido, mesmo com vereadores da oposição na Câmara Municipal. (Não seria, também, algo inteiramente novo em Portugal, a existência de ministros sem pasta.) Portanto, quando há eleições legislativas, na prática, o que acontece é que o povo exerce o seu poder de eleição de deputados seus representantes e é também consultado acerca do partido que quer no poder. Terminada essa eleição e terminada a indigitação do governo, o povo enquanto povo, na prática, perde todos os seus poderes, tendo que ficar reféns da ditadura da maioria absoluta ou tendo que ficar reféns de acordos pontuais do maior partido com os outros. Não é uma queixa ou uma ovação, é um facto, é assim que acontece.
Assim, o governo é, de facto, uma entidade própria que, na prática, não está sujeita a qualquer tipo de escrutínio. Considero isto um ataque vil à democracia. Mesmo assim, curto e grosso. Como já disse, um sistema de governo como o sistema autárquico era, para mim, o melhor sistema de governo porque incluíria ministros (com ou sem pasta) dentro do próprio governo que não pertenceriam ao partido que tinha ganho. Porque o próprio governo tem formas de fazer aprovar determinado tipos de diplomas sem ser necessária a aprovação em Assembleia da República. Era assim uma maneira de salvaguardar a democratização e o direito a dizer "não" dos outros partidos em sede de governo. Para tal funcionar teria que haver um número limitado de ministros, uma espécie de numerus clausus governamental, para as regras de distribuição de lugares serem atribuídas justamente. Implicaria também a regionalização. E porquê a regionalização? Porque, para tal ser feito, as eleições de deputados e ministros teriam de ser feitos a nível nacional, não a nível distrital como hoje acontece nas eleições legislativas. Não teria cabimento algum um ministro ser eleito por Setúbal e outro pelo círculo da Europa. Não faz sentido, simplesmente, se não se quiser ter um número absurdo de ministros. Da mesma maneira, e por uma questão lógica, a Assembleia da República não poderia deixar de ser eleita a uma escala nacional, paralelamente ao governo eleito. Logo, a regionalização e a criação de governos regionais seriam essenciais para a deslocalização do poder e a repartição de responsabilidades do governo central. Isto retiraria o poder de indigitação do governo ao Presidente da República; no entanto, creio ser um modelo mais democrático e que dá a oportunidade de estarem outros partidos representados no governo que não seja apenas aquele que tem a maioria na Assembleia da República. Leva isto a que, se uma pessoa gosta de determinado partido político, mas não gosta da sua actuação governativa, possa votar nesse partido para a AR e votar noutro que também lhe agrade para o governo. Assim, haveria a possibilidade de serem eleitos representantes dos mais diversos quadrantes políticos em todos os órgãos de poder, à excepção do Presidente da República, pela própria natureza eleitoral e dos poderes deste.
O povo, então, elegeria de quatro em quatro anos, em eleições simultâneas e semelhantes às do actual poder local democrático, o seu Governo Regional, os seus deputados à Assembleia Regional, os seus deputados à Assembleia da República e o seu Governo Central. De cinco em cinco anos, as eleições para o Presidente da República manter-se-iam.
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