2010/04/22

O Amor e a Pessoa Certa: Parte I - O que é Amor

Arriscando-me a voltar às lamechices, vou agora falar um pouco sobre o "amor" e a "pessoa certa", esses dois lugares comuns tão banais nos dias que correm, não porque as pessoas consideram existir muito, mas porque a generalidade das gentes considera serem algo tão impossível de alcançar que desistem ainda a viagem não começou. Assim, este é um post a duas partes, uma inteiramente dedicada ao amor, outra inteiramente dedicada à pessoa certa.

Comecemos pelo "amor" que, sendo difícil de definir, torna mais facil o trabalho de definir depois "pessoa certa". "Amor", para o haver mesmo, segundo uma perspectiva científica, tem que seguir os parâmetros do triângulo de Sternberg (ou "Teoria triangular do amor de Sternberg", para dar um ar mais pomposo), que compreende três elementos fundamentais: paixão, intimidade e compromisso. Só havendo paixão, só há desejo sexual; se só há intimidade, só há confidências e amor do estilo 'fraterno' - amizade; se só há compromisso, há um amor vazio, onde não habita nenhum outro sentimento senão o de posse e de possuído face ao outro. Assim, da mesma maneira, não podem haver só dois deles a co-existir e chamar-se "amor" à mesma. Portanto, temos que se só houver intimidade e paixão, temos aquele amor romântico, do tipíco cliché dos dois amigos que se encontram sexualmente uma vez por outra, sem se preocuparem em manter uma relação estável (compromisso); se só houver intimidade e compromisso, temos aquela situação de grande companheirismo, das melhores amizades e as mais duradouras, sem, no entanto, haver atracção sexual (paixão); se só houver compromisso e paixão, temos um amor frio, onde há uma forte atracção sexual e a necessidade de a manter regular, mas não há a compreensão e a aceitação do outro como ele é, nem uma conversa boa, nem sequer uma afeição pelo outro (intimidade). Assim, em moldes gerais, o "amor" é quando duas pessoas que se sentem sexualmente atraídas se comprometem uma com a outra, havendo uma relação de afeição entre elas. Claro que isto tudo num sentido muito científico, muito psicobiológico... Entrando por campos da filosofia e campos menos "concretos" (não gosto de usar esta palavra para a filosofia) teria que citar filósofos gregos, entre outros, e não estou muito inclinado a fazê-lo neste momento, não por preguiça ou por falta de meios, mas porque para o que quero escrever é algo desnecessário.
O amor, para mim, para funcionar numa relação feliz e estável, tem que ter essas três componentes, mas indo sendo adicionadas de forma sequencial. Para algo funcionar no amor, tem que começar por um dos três vértices do triângulo e sendo adicionados os outros, até obter o triângulo completo, não ao acaso, mas de uma forma sequencial.
Assim, para algo funcionar, tem que haver uma intimidade, em primeiro lugar. Intimidade que, aqui, toma o valor de amizade. De seguida, tem de começar a haver um certo compromisso. Só no fim pode vir a paixão e a atracção sexual.
Não digo isto por achar que é a ordem mais bonita ou o que é mais social e politicamente correcto. De vez em quando gosto de pensar e foi a pensar que cheguei a estas conclusões.
Raciocinemos. Se viesse primeiro a paixão, qualquer outro sentimento seria desvanecido, porque é assim a natureza animal do ser humano. Podem-me mostrar dados que digam o contrário, que rapidamente adoptarei outra postura, mas é isto o que eu considero ser verdade, que o ser humano, quando esta atraído sexualmente por outrém, sem ter um mínimo de intimidade, o que lhe interessa é saltar para dentro das calças dessa pessoa. Se, por outro lado, viesse em primeiro lugar o compromisso, seria das relações mais bizarras que alguma vez aconteceram, duas pessoas que não se conhecem minimamente establecerem um vínculo de tal forma potente que estão quase condicionadas a estarem uma ao pé da outra sem perceberem muito bem porquê.
Assim, pela razão da paixão toldar tudo o resto com o desejo sexual, é lógico que o segundo elemento seja o compromisso. Ficamos assim com uma amizade reforçada pelo compromisso, um companheirismo amoroso.
Para haver o amor, é necessário que esteja lá a paixão, portanto, por exclusão de partes, é aqui que ela entra.

Um exemplo ilustrativo: Duas pessoas vão no mesmo transporte público. Começam a falar e cria-se uma empatia e amizade ali entre aqueles dois seres humanos. Com o tempo a avançar, cria-se o compromisso de se ir sempre no mesmo lugar, a ter conversas cada vez mais profundas e um sentido de obrigação para com o outro cada vez maior. O tempo avança um bocadinho mais (esse maroto) e começa a criar-se uma atracção sexual mútua. Está criado o amor.

Mas não se pode ter o amor criado como algo garantido, nem as suas componentes aparecem do nada. É preciso algum esforço, para umas pessoas mais, para outras menos, mas é sempre preciso um esforço, para que apareçam as componentes da tríade e para que elas se mantenham no sítio. Porque, sem esforço, a pessoa que perde o compromisso pode ser acusada de infidelidade; a que perde a amizade de se ter tornado em alguém frio e insensível para com o outro; a que perde a paixão de se ter tornado numa pessoa não mais que amiga e que já não vale de nada estar com essa pessoa para nos satisfazer os desejos sexuais.
Assim, se ainda restar intimidade, é bom manter-se uma relação, ainda que mais fragilizada, não porque poderá voltar a reacender-se o amor, mas porque o Homem precisa de se conectar com outros seres humanos para ser feliz e, se já há amizade com alguém, porquê perde-la?
Se se continuar com uma ligação a uma determinada pessoa com o intuito de voltarem a ter o que tinham antes, é possível (mas não certo) que fiquem duas pessoas frustradas e sempre a repisar os erros dos outros no passado.

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