Os escravos de hoje em dia não estão agrilhoados. Os escravos contemporâneos não trabalham por medo ao chicote. Os escravos, que agora são mais numerosos que nunca, nem vivem muito mal, a maior parte deles. Os escravos de hoje são pagos pelo seu trabalho (mal ou bem), têm direito ao voto e são escravos. Os escravos que hoje são escravos, são-no mentalmente. As piores prisões que existem são as prisões do pensamento. A mente dos escravos está agrilhoada, têm medo das chicotadas metafóricas do olhar de lado ou da opinião pública, está a apodrecer viva e exerce mal os direitos que tem. Os escravos de hoje em dia movem-se para a frente e para trás, todos os dias na mesma rotina, sem fazer nada de novo. Deixam-se modelar pela opinião pública e levam-se não pelo seu próprio pensamento, mas por uma espécie de pensamento colectivo, que a maior parte tem. Os escravos dizem que não gostam de qualquer coisa, mas acabam por o fazer repetidamente com medo do que os outros possam pensar.
Os escravos de hoje em dia votam PS e PSD, porque acham que ninguém fará melhor. E porque é bonito votar no que toda a gente vota. E porque é bonito achar que as sondagens têm razão. E porque é bonito dizer "o meu partido pode ser uma merda, mas foi o que ganhou". Novidades para os escravos: qualquer um dos partidos da AR, sem ser esses dois, faz melhor. Pior, de certeza, nunca farão.
Os neo-escravos estão convencidos que a comunicação social é verdadeiramente boa. Mas esquecem-se que Portugal não tem só as cores laranja e rosa. Tem também vermelho, verde, preto, amarelo, azul, branco... Os neo-escravos olham para os jornais e vêm as guerras ao bom estilo de uma má telenovela (haverá alguma boa?) entre PS e PSD e convencem-se que tem de ser assim. Novidades para os escravos: não tem de ser assim. Haja abertura de mente e visão do mundo e Portugal ficará muito melhor.
Os escravos que hoje por aí pululam, são presos. E, pior que presos, são egoístas e lambe-botas. Quantas vezes não se ouve "para quê aderir à greve geral se até nem estou assim tão mal"? Quantas vezes dá vontade de dar um bom par de estalos a quem pensa assim? E os que estão mal, só porque estão mal não podem ser acompanhados na luta? E os escravos já se perguntaram porque é que, em vez de 'menos mal', não estão bem? Não querem estar bem? Novidades para os escravos: hoje eles, amanhã vocês.
Os escravos são pessoas que gostavam de ser patrões. E, portanto, voluntariam-se a ser escravos porque fica bonito. Porque se o patrão o vir assim, prontinho a ajudar, contra os comunas dos sindicatos e sempre PS-PSD, viva, hurra, que tanto defendem o patrãozinho. Novidades para os escravos: quando faltar o dinheiro, o patrão não vai cortar nele. Vai cortar em vocês.
Os escravos de hoje em dia não aderem a greves gerais, nem a manifestações, porque são coisas que provocam instabilidade social. Provocam tumultos e esses escravos gostam de ser escravizados em paz e sossego, sem muita confusão, que lhes dá cabo da cabeça e não ganham o suficiente para os 'bénurons'. Os escravos de hoje em dia não gostam de lutar porque do que gostam mesmo é de ficar de papo para o ar sem fazer nada. Novidades para os escravos: as instabilidades, as confusões e os caos já foram instaurados. As greves e manifestações são demonstrações públicas de indignação.
Depois há os trabalhadores. Os trabalhadores sabem que as coisas podem ficar melhores e não votam PS/PSD. Os trabalhadores desligam das novelas obsoletas e romanescas do Sócrates com o Passos Coelho e sua relação amor-ódio e dedicam a sua atenção às propostas e ao que os outros, mais sérios, dizem. Os trabalhadores querem ter uma vida melhor, bem melhor que a que têm agora que, em grande parte dos casos, é má. Os trabalhadores vão contra o patrão, não lhe beijam o rabo e o chão por onde passa, e fazem greves e participam em manifestações, sempre que possível. Quando não é possível (por causa de ameaças, ou outros motivos), ou fazem-no à mesma, ou arranjam outras formas de luta e protestam à mesma contra as injustiças.
Novidades para os escravos: vocês podem ser trabalhadores. Basta quererem.
E tu, queres ser neo-escravo ou queres ser trabalhador?
Este blogue estará de greve, assim como o seu escritor, no dia 24 de Novembro de 2010.
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